Inspirado na palestra a qual fui convidado a realizar ontem, junto a alguns estudantes de medicina, na disciplina de psiquiatria da Universidade de Brasília – UnB, escrevo este post. Nada muito novo, pois no livro “A prática clínica da terapia cognitiva com crianças e adolescentes”, Friedberg e McClure escrevem que: “Muitos terapeutas cognitivos contam com dados de entrevista e informações recolhidas de instrumentos de avaliação, a maioria deles usa medidas de auto-relato e escalas. (…) Técnicas projetivas, como o Teste de Apercepção Temática (TAT) (…) e o teste de Rorschach (Exner) são usados por alguns clínicos cognitivo-comportamentais”.
O Rorschach é um instrumento psicológico em que a percepção de um borrão de tinta pelo sujeito é transformada em dados para posterior comparação estatística e interpretação. Há vários sistemas de interpretação que possibilitam a organização das informações obtidas e integração à uma teoria. Os sistemas de base psicanalítica utilizam as pranchas do teste de forma a suscitar associações. No método Exner, a percepção do indivíduo é o foco e os dados são considerados dentro de comparações estatísticas para definições sobre as forças e fraquezas do indivíduo.
A polêmica se refere ao fato da classificação do Rorschach como técnica projetiva e, por falar de projeção (quando as pessoas atribuem seus elementos internos a objetos ou eventos externos), implicaria no uso da psicanálise para sua utilização. Contudo, segundo Weiner, o próprio Rorschach não mencionou a projeção na sua monografia sobre o instrumento. Isso não quer dizer que a projeção não se manifeste em algumas respostas ao teste. Exner veio mostrar que a projeção não é inevitável, mas também não é essencial ao Rorschach.
A interpretação dos dados faz-se agrupando-os em módulos, referentes a sete componentes do funcionamento da personalidade, que propiciam a interpretação:
· Módulo: processamento da informação, relativo a como as pessoas dirigem sua atenção ao mundo.
· Módulo: mediação cognitiva, que envolve o modo como as pessoas percebem os objetos de sua atenção.
· Módulo: ideação, que consiste no modo como as pessoas pensam sobre o que percebem.
· Módulo: controle e tolerância ao estresse, associado aos recursos adaptativos de que as pessoas dispõem para lidar com as demandas e gerenciamento do estresse.
· Módulo: recursos afetivos, que compreende o modo como as pessoas lidam com as situações emocionais e como vivenciam e expressam os afetos.
· Módulo: autopercepção, associado a como as pessoas percebem a si mesmas.
· Módulo: percepção interpessoal, que investiga como as pessoas percebem os outros e se relacionam com eles.
Pelo Sistema Compreensivo de Exner tratar de, por exemplo, processamento da informação numa interpretação de Rorschach e partir da suposição que há uma diferença na percepção de indivíduos segundo o transtorno mental que apresentam, é notório que uma compreensão para além da psicodinâmica é clara e possível. Nada seria mais ‘cognitivo’.